Brasileiros correm atrás do seguro-viagem e especialista alerta para “armadilhas invisíveis” nos contratos

Alta na contratação expõe mudança de comportamento do consumidor e reforça a necessidade de atenção redobrada a coberturas, carências e regras de reembolso antes das férias

A reta final do ano e o aumento das viagens de férias e festas vêm puxando a procura por seguro-viagem entre os brasileiros. A combinação de destinos internacionais mais acessíveis, passagens compradas com antecedência e medo de imprevistos, especialmente com saúde, cancelamentos e bagagens, fez o produto deixar de ser visto apenas como custo extra. Empresas do setor projetam, somente neste último trimestre, um avanço de 20% em relação ao mesmo período de 2024.

 “Antes isso era visto como um custo, um empecilho. E agora não. A gente vê que isso está fazendo parte cada vez mais do pacote de viagens”, afirma o advogado especialista em direito do consumidor Stéfano Ribeiro Ferri.

Segundo o especialista, a tendência é de crescimento contínuo ao longo de todo o ano, e não apenas em dezembro e janeiro. “A expectativa é de crescimento e não apenas pelo aumento da consciência do consumidor, mas também, porque em muitos casos, os seguros são obrigatórios. Então, quando a gente fala de viagens internacionais, muitos países exigem, por exemplo, a contratação de seguros, envolvendo questões de saúde. Então, isso também agrega nos números”.

Ao mesmo tempo, os seguros se diversificaram: além de saúde, crescem as contratações para cancelamento de viagem, alteração de datas, extravio de bagagem e até modalidades anuais para quem viaja com frequência a trabalho ou lazer. E, na hora de contratar, porém, o maior risco está no que o consumidor não lê.

Ferri alerta que a maioria das pessoas não se aprofunda nas cláusulas, especialmente quando o seguro vem atrelado ao cartão de crédito ou à agência. “Sempre que a gente fala do seguro saúde, por exemplo, é importante destacar que as pessoas, e isso não é feito pela maioria das pessoas, tem que tomar muito cuidado com todas as cláusulas”, diz.

Ele reforça que “o principal ponto é sempre ler os contratos de forma detalhada, contar com o auxílio de pessoas que trabalham com isso, sejam as agências de viagem, advogados, tudo que a pessoa possa se cercar para entender se aquela cobertura é, de fato, o que ela precisa”. Em relação a doenças pré-existentes, Ferri lembra que abusos podem ser contestados: “É ônus da empresa comprovar que o consumidor agiu de má-fé” e, mesmo com contrato assinado, “o Código de Defesa do Consumidor dá essa proteção”.

Mais opções

A contratação de seguros para cancelamento também vem ganhando espaço, sobretudo em viagens programadas com grande antecedência. Esses produtos podem cobrir situações como morte de familiar ou problemas graves que impeçam o embarque, protegendo o viajante desde o momento da compra até o início da viagem.

Ao mesmo tempo, o cenário judicial em casos de voos cancelados pela companhia traz incerteza: processos envolvendo cancelamentos ou alterações atribuídas a fatores externos, como clima ou problemas de pista, foram suspensos pelo STF até que a Corte fixe uma orientação geral.

Para Ferri, isso torna a prevenção ainda mais necessária, já que recorrer à Justiça nem sempre compensa. “O judiciário está afogado em ações envolvendo relações de consumo, cada vez mais moroso e indenizações menores, o que leva muitos consumidores a acumularem frustração. Então, a prevenção hoje em dia é fundamental e a informação hoje está ao alcance de todos”, analisa Ferri

Quando o problema é bagagem, a regra continua clara: primeiro, responde a companhia aérea. “Falando especificamente do extravio, quem tem que indenizar primeiramente o consumidor é a companhia aérea”, explica Ferri.

Em voos nacionais, a empresa tem sete dias para localizar a mala ou indenizar o passageiro; em voos internacionais, o prazo sobe para 21 dias. “Se a companhia não resolver, o consumidor pode acionar o Judiciário mesmo que tenha seguro contratado. Caso a seguradora indenize, ela depois pode buscar ressarcimento junto à empresa aérea”.

O advogado orienta ainda a registrar boletim de ocorrência, guardar documentos e acionar o balcão da companhia já no aeroporto, para comprovar a tentativa de solução.

Na ponta do lápis, a alta na procura por seguro-viagem também impacta preços, especialmente no fim do ano. Ferri lembra que o reajuste em períodos de maior demanda não é, por si só, ilegal. “Em regra, o preço pode ser dinâmico, como é com aplicativos de transporte. Eles vão mudando conforme o horário, conforme a demanda, isso é tudo dentro da lei. O que deve ser monitorado são práticas como combinação de preços ou formação de cartel”.

Para o consumidor, a melhor defesa continua sendo planejamento e comparação de ofertas: a orientação, segundo o advogado, é “nunca fazer nada na pressa, não simplesmente confiar na agência ou no convênio do seu cartão de crédito, sempre olhar no detalhe, comparar os preços para saber se não está contratando algo muito fora do mercado”.

Não caia em armadilhas

>Planeje com antecedência: evite contratar o seguro em cima da hora, apenas para “cumprir requisito” do destino. Com mais tempo, dá para comparar coberturas e preços.

>Leia o contrato inteiro: verifique limites de cobertura, exclusões, franquias, reembolso, regras de atendimento e se há restrições por idade ou doenças pré-existentes.

>Fique atento à carência: em seguros como os de celular ou roubo, confira se há período de carência (30, 60 dias, por exemplo) antes de a proteção começar a valer.

>Cheque se o seguro do cartão é suficiente: muitas vezes a cobertura automática do cartão de crédito é básica ou restrita. Peça a apólice, leia as condições e compare com outras ofertas.

>Confirme cobertura de saúde no destino: para viagens internacionais, verifique se o valor segurado é compatível com o custo médico local e se há rede credenciada onde você vai ficar.

>Considere seguro multiviagens se você viaja muito: quem entra e sai de aeroportos o ano todo pode economizar com uma apólice anual em vez de contratar seguro a cada viagem.

>Guarde todos os comprovantes: em caso de problema com voo ou bagagem, registre a ocorrência no balcão da companhia, guarde protocolos, e, se necessário, faça boletim de ocorrência.

>Use o seguro sem abrir mão dos seus direitos: ter seguro não impede acionar a companhia aérea, a agência ou o Judiciário quando houver falha de serviço ou dano moral/material.

Fonte: Stefano Ribeiro Ferri – Especialista em Direito do Consumidor. Assessor da 6ªTurma do Tribunal de Ética da OAB/SP. Relator da comissão de Direito Civil da OAB –Campinas. Formado em direito pela Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP)

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